Quando se fala em tijolo de maconha, raramente pensamos em um objeto usado para a construção civil, mas essa é uma das aplicações que estão sendo pensadas para aproveitar ao máximo a cannabis. A planta tem sido cultivada no Brasil com maior frequência nos últimos anos para tratar diversos problemas de saúde, de convulsões às dores do câncer.
Um projeto pioneiro da Unidade Embrapii Fibras Florestais, da Universidade Federal de Viçosa (UFV), quer produzir em escala industrial e aproveitar integralmente a cannabis para fins medicinais e industriais.
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Produção de maconha
A iniciativa já clonou mais de 4 mil mudas a partir de apenas 14 sementes. A autorização judicial para o cultivo foi concedida em fevereiro de 2024. Em apenas quatro meses, o grupo desenvolveu um dos maiores jardins clonais de cannabis do mundo.
“Com mais plantas, os medicamentos devem ficar mais baratos e as pessoas com menor renda vão ter acesso aos remédios, que estarão em breve nas prateleiras das farmácias. Teremos benefícios econômicos na ordem de bilhões de reais para o país, além de potencializar o mercado de exportação. O potencial é gigantesco”, explica o professor da UFV Glêison Santos.
Ele pontua que o uso apenas para a produção de medicamentos pode gerar uma quantidade grande de desperdício. “São extraídos o CBD e outros compostos que vêm das flores, representando 15% das plantas. Os outros 85% da biomassa da cannabis, o caule, folhas e raízes, podem ser utilizados na indústria”, completa.
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A Cannabis, também conhecida como planta da maconha, tem origem asiática repleta de polêmicas. Socialmente marginalizada, sob a luz da ciência, no entanto, apresenta potencial medicinal para tratar diversas patologias
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Segundo especialistas, a cannabis tem substâncias, como os canabinoides, capazes de agir e desencadear reações em diversas áreas do corpo, como o cérebro
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A cannabis apresenta três espécies: ruderalis, indica e sativa, sendo as duas últimas as mais populares. No caso da sativa, pode-se ainda destacar o canabidiol, que tem efeito relaxante e, por isso, é utilizado com fins terapêuticos
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Além do canabidiol, na cannabis sativa é possível encontrar tetrahidrocanabidiol, substância com capacidade de gerar sensações de prazer, alívio, euforia, entre outras
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Na indústria farmacêutica, as propriedades da cannabis podem funcionar como anticonvulsivo, analgésico e sedativo no tratamento de doenças, tais como: epilepsia, esquizofrenia, esclerose múltipla, Parkison e dores intensas
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Por esses motivos, cada vez mais países têm regulamentado o uso da substância para tratamento de enfermidades, apesar de muitos ainda proibirem a utilização da cannabis para fins recreativos
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Canadá, Estados Unidos, Alemanha, Holanda, Dinamarca, Itália, Espanha, Bélgica, Portugal, entre outros países europeus, permitem, com regras próprias, a utilização da maconha para uso medicinal
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Na América Latina, países como Argentina, Uruguai, Colômbia, Jamaica, Equador e México, por exemplo, também liberam a cannabis para fins medicinais e terapêuticos
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Cada estado define as especificidades em torno da utilização da maconha medicinal, mas, no geral, as autorizações funcionam de duas maneiras: permissão apenas para uso terapêutico e medicinal ou liberação também para uso recreativo
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No Brasil, a Anvisa permite a importação e o uso da substância em alguns remédios desde 2014. Até então, as plantas ainda precisavam ser trazidas do exterior. No entanto, em 2021, a Câmara dos Deputados aprovou o Projeto de Lei 399/2015, que autorizou o cultivo de Cannabis sativa no Brasil para fins medicinais, veterinários, científicos e industriais
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Por aqui, para realizar a compra de medicamentos ou produtos derivados de cannabis (ambos com fins medicinais) é necessário ter prescrição médica. Além disso, é preciso ter condições para adquirir os produtos, uma vez que o valor a ser desembolsado pode alcançar quatro dígitos
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Construção, celulose e sustentabilidade
A meta é zerar o desperdício e maximizar o uso industrial da planta. Na construção civil, por exemplo, os resíduos viram hempcrete — um tipo de tijolo sustentável. “Já há iniciativas de construção que não apenas reduziram o uso de concreto como o substituiram o integralmente por esse material”, diz Glêison.
A fibra da cannabis também produz celulose de alta qualidade, o que pode melhorar a fabricação de papel. O Brasil já lidera esse mercado com eucalipto e pinus. Com o cânhamo e a maconha, o país pode agregar valor à cadeia e ampliar a balança comercial de exportação usando a estrutura já existente.
Produção mineira
O investimento total do projeto chega a R$ 932 mil. O objetivo é estabelecer um novo modelo de cultivo em larga escala, com potencial para exportação a países como China, EUA, Canadá e membros da União Europeia.
“Nos últimos anos, estamos descobrindo aplicações realmente interessantes do ponto de vista médico para a cannabis e precisamos voltar mais nossa atenção a este potencial. Até em pacientes oncológicos, os extratos de cannabis se mostraram extremamente eficazes no manejo dos sintomas da dor e de outros desconfortos como a fadiga e a perda do apetite”, explicou o geriatra Felipe Gusman, chefe dos cuidados paliativos do Hospital Copa Star, em entrevista anterior ao Metrópoles.
O mercado de cannabis medicinal movimentou R$ 399 milhões no Brasil em 2024. A estimativa da consultoria Kaya Mind é de que o setor alcance R$ 860 milhões até 2027, com a entrada de grandes farmacêuticas como Aché, Hypera e Biolab no mercado.
Cerca de 672 mil pacientes brasileiros já utilizam medicamentos à base da planta. O número de prescrições médicas dobrou em 2024 e 69% dos médicos passaram a receitar os extratos, com destaque para especialidades como psiquiatria e neurologia.
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