Chloe Stanley tem 12 anos de idade e mora com a mãe, o irmão e a avó na cidade de São Paulo. Em fevereiro, a família conseguiu na Justiça a guarda unilateral da moçoila e, com isso, o recta de iniciar o bloqueio hormonal na jovem, que é uma pequena trans. O pai de Chloe não aceita a quesito da filha. A previsão era que o tratamento começasse no dia 26 de agosto, sob a orientação de um endocrinologista. Uma solução publicada esta semana pelo Parecer Federalista de Medicina (CFM) que proíbe o bloqueio hormonal em menores de idade, entretanto, pode modificar os planos da família.
Em entrevista à Sucursal Brasil, a mãe de Chloe, Tatiam Stanley, relata que a filha foi diagnosticada com disforia de gênero severa e que o maior pavor da moçoila é iniciar a puberdade e desenvolver características masculinas.
“De repente, fomos minados, bombardeados com essa notícia de uma solução onde o CFM proíbe o bloqueio em crianças. Nosso mundo desabou. Simplesmente um retrocesso de anos na história. Chloe está desolada com toda essa situação. Estou tentando fazer com que ela se anime e tenha esperança”.
“Não é provável que não haja zero que possa ser feito diante dessa imposição do CFM. Eles não sabem o que é vivenciar essa história, o que é sentir ser alguém que a sociedade não acredita que existe, que impõe suas verdades e acha que nós temos que cumprir. Retrocedemos anos. Anos! Demos passos pra trás absurdamente. Está na Constituição: saúde para todos. É obrigação do Estado, não é? Mas estão tirando os direitos das nossas crianças e adolescentes trans de existirem e de fazerem o uso do bloqueio”, acrescenta Tatiam.
Tatiam alerta que há risco de crianças e adolescentes trans, diante da proibição e em razão do desespero, buscarem outras formas de aproximação e de fazer uso de bloqueadores hormonais, colocando em risco a saúde e a integridade de cada um deles e de suas famílias.
“O recta à saúde não é de todos? Não é um obrigação do Estado? Porquê é que eles agridem assim, proibindo e tirando um recta que é nosso? Para gente, foi lamentoso, foi desolador”, afirma.
“É um ultraje o que o CFM está fazendo. Pra mim, chega a ser uma monstruosidade. Não houve nenhum diálogo com os ambulatórios que tratam de crianças e adolescentes trans. Não conversaram com as famílias, zero. Simplesmente sentaram, se reuniram, decidiram por nós. E nós temos que cumprir e permanecer de braços cruzados, vendo o que eles estão fazendo com os nossos filhos, filhas e filhes? De forma alguma. A gente tem que fazer alguma coisa. Tem que ser feita alguma coisa. Não dá pra continuar desse jeito”.
Diogo Leal mora em Florianópolis com a esposa e a filha, uma moçoila trans de 9 anos de idade, e traz um relato muito similar ao de Tatiam. Ele conta que V [nome preservado a pedido da família], desde pequena, sempre curtiu brincadeiras diferentes das tradicionalmente definidas pela sociedade para meninos.
“Mas a gente pensa, essa coisa de galhofa de menino e de moçoila é uma coisa inventada”, diz.
Foi em meio à pandemia da covid-19, entretanto, que a identificação com o sexo feminino se mostrou mais intensa.
“Não sei se foi porque a gente acabou passando mais tempo juntos em vivenda e, com essa privacidade, ela se sentiu mais livre para ir se expondo. Foi nesse período que essas mudanças começaram a sobrevir de forma mais intensa. Ela, primeiramente, quis usar fantasias de princesas e de super-heroínas, ela gostava muito da Batgirl e da Elza [personagem do filme Frozen, da Disney]. A partir daí, foi um passo para ela principiar a querer usar exclusivamente roupas de moçoila”, disse.
Com a retomada das aulas no período menos crítico da pandemia, V já voltou para o envolvente escolar com os cabelos mais compridos e vestindo uniforme do sexo feminino.
“No meio do 1º ano, ela decidiu que queria ser chamada de V. Ela já falava na escola e também já tinha falado pra gente. Conversamos com o escola e deu tudo perceptível, não tivemos grandes problemas. É uma escola pública municipal e eles aceitaram usar o nome social dela”, explicou.
“Tem sido um processo. A gente vai sempre acompanhando cada lanço. Às vezes, são coisas bobas, tipo deixá-la ir à vivenda de uma amiguinha. Acho que a maioria dos pais já fica preocupada, mas a gente fica ainda mais preocupado porque não sabe se vai possuir qualquer tipo de preconceito. São coisas pequenas, mas a gente fica muito nervoso. A cada lanço da vida dela, a gente fica super preocupado. Se ela vai tolerar preconceito e uma vez que a gente pode ajudá-la e protegê-la”, relata.
Com 9 anos de idade, V se aproxima da puberdade. E a solução do CFM preocupa a família da moçoila.
“Até portanto, pais e responsáveis por crianças e adolescentes trans tinham a possibilidade, mediante séquito médico, simples, de, nessa tempo da puberdade, entrar com o bloqueio hormonal. Um meio para dar uma paragem no desenvolvimento das características biológicas. No caso da minha filha, seria não crescer pelo no rosto, por exemplo”, explicou.
“Isso é muito importante para essas crianças e adolescentes, para que eles possam se declarar uma vez que quem são de vestuário, uma vez que se sentem. E é também uma forma de proteger a V numa sociedade em que há bastante preconceito. Cabe lembrar que, no Brasil, a expectativa de vida de uma pessoa trans é 35 anos. Numa sociedade que tem tanto preconceito, a terapia hormonal é até uma forma de proteção. Essas crianças e adolescentes se sentem mais felizes consigo mesmos, com o corpo deles, graças a esse bloqueio hormonal”, defende.
“Essa medida do CFM atinge essas pessoas de duas maneiras. A primeira é negando que existem crianças e adolescentes trans e, por isso, não haveria premência de bloqueio hormonal e da hormonização cruzada, exclusivamente na maioridade, a partir dos 18 anos. Uma negação do sentido da existência e, portanto, de todo tipo de auxílio, ajuda, séquito médico e psicológico. E a segunda coisa é a consequência disso. Com certeza, vai fazer com que essas crianças e adolescentes e suas famílias sofram mais”.
O pai de V teme que a solução acabe abrindo caminho para que crianças e adolescentes trans fiquem ainda mais suscetíveis a tolerar transfobia.
“O índice de depressão e de tentativa de suicídio na população trans no Brasil é altíssimo na fita de menores de 18 anos, 14%, muito maior que entre as pessoas cis. E esses dados, muitas vezes, são subestimados, você não consegue captar tão muito uma vez que é a veras. Eu, uma vez que pai, fico extremamente preocupado”, alerta.
“Minha filha ainda não está tomando o bloqueio. Ela é acompanhada por um ambulatório trans, que é onde nós tínhamos que fazer os exames para ver a questão dos hormônios e, em seguida, levar aos médicos para ver se já estaria no momento de iniciar o bloqueio hormonal ou se esperamos mais um pouco”, explica o pai de V.
“A gente sabe que isso é muito importante para a felicidade dela, e eu, uma vez que pai, e minha esposa, uma vez que mãe, a gente fica muito exitante e preocupado em relação a uma vez que isso pode afetar ela. Não só em relação à felicidade dela. Minha esposa, por exemplo, está arrasada. Tem tomado remédio para dormir. Ela tem pavor de uma vez que a nossa filha pode reagir quando chegar nesse momento e ela não tiver uma vez que tomar o bloqueio hormonal. Ou mesmo quando chegar aos 16 anos e não puder tomar o hormônio”.
“Na Constituição está disposto que todas as pessoas têm recta à saúde e que é obrigação do Estado prover, prometer esse recta. E essa solução que saiu vai contra isso. Nega o aproximação a direitos de crianças e adolescentes, da população trans em universal. Não só nega direitos uma vez que o Estado proíbe os médicos de proverem o recta à saúde para essa população. É gravíssimo. Arrasador. Os pais estão discutindo entre si uma vez que a gente pode mourejar com isso”.
Entenda
A solução do CFM publicada em 16 de abril proíbe o bloqueio hormonal para crianças e adolescentes com incongruência e/ou disforia de gênero. A entidade estabelece ainda que terapia hormonal cruzada – governo de hormônios sexuais para induzir características secundárias condizentes com a identidade de gênero do paciente – só poderá ser iniciada a partir dos 18 anos de idade.
A solução também restringe o aproximação a cirurgias de redesignação de gênero para pessoas trans antes dos 18 anos de idade e, nos casos em que o procedimento implicar potencial efeito esterilizador, antes de 21 anos.
Por termo, a solução determina que pessoas trans que mantêm seus órgãos reprodutivos biológicos devem buscar atendimento médico preventivo ou terapêutico com especialistas do sexo biológico e não conforme sua identidade de gênero.
MPF
O Ministério Público Federalista (MPF) instaurou procedimento para apurar a validade da solução.
Em nota, a entidade destaca que a publicação altera as normas que definem o atendimento e a realização de procedimentos médicos ofertados a pessoas trans, incluindo crianças e adolescentes.
De concordância com o MPF, o procedimento foi descerrado a partir de denúncia feita pela Associação Mães pela Pluralidade e de nota técnica publicada pela Antra.
“As entidades comunicaram o vestuário e demonstraram a preocupação de familiares de crianças com versatilidade de gênero ou adolescentes trans que sofrem de disforia de gênero e que têm aproximação a procedimentos terapêuticos uma vez que bloqueio puberal e hormonização cruzada”, disse o MPF.
O que diz o CFM
Em coletiva de prensa, o presidente do CFM, José Hiran Gallo, ressaltou que a solução foi aprovada por unanimidade pelo plenário da entidade.
“Todos os 28 conselheiros presentes aprovaram essa solução”, afirmou.
O médico ginecologista Rafael Câmara, mentor pelo estado do Rio de Janeiro e um dos relatores da solução, destacou que se trata de um tema em que as evidências e os fatos mudam a todo momento.
“É procedente que essas resoluções sejam alteradas”, disse.
Ao tratar da vedação da terapia hormonal cruzada para menores de 18 anos de idade, ele lembrou que a solução anterior do CFM estabeleceu 16 anos de idade uma vez que a idade mínima para a governo de hormônios sexuais com essa finalidade.
“Não é um tanto inofensivo”, disse, ao reportar riscos uma vez que o aumento de doenças cardiovasculares e hepáticas, incluindo cancro, fertilidade reduzida, calvície e acne, no caso da testosterona, e problemas tromboembólicos e cancro de peito, no caso do estrogênio.
Sobre bloqueadores hormonais, o médico destacou que o uso desse tipo de terapia no intuito de suprimir a puberdade em crianças e adolescentes é motivo de discussões e questionamentos frequentes.
Câmara lembrou que, em abril do ano pretérito, o Reino Unificado aboliu o uso de bloqueadores sexuais. Segundo ele, Finlândia, Suécia, Noruega e Dinamarca, “países com sistemas de saúde fortes e de tendência progressista”, também proibiram a terapia.
“A exposição a hormônios sexuais é importante para a resistência óssea, para o propagação adequado e para o desenvolvimento de órgãos sexuais”, lembrou, ao reportar, dentre as consequências, densidade óssea comprometida, profundidade alterada e fertilidade reduzida.
O médico ressaltou que a vedação do uso de bloqueadores não se aplica a situações clínicas reconhecidas pela literatura médica nas quais o uso é cientificamente comprovado, incluindo quadros de puberdade precoce e doenças endócrinas.
Câmara cita ainda o aumento de relatos de contrição de transição e mesmo de destransição sexual desde 2020, o que levou diversos países a revisarem seus protocolos para mourejar com a incongruência e a disforia de gênero.
Outro ponto realçado pelo médico trata do sobrediagnóstico, sobretudo entre menores de idade.
“Mais crianças e adolescentes estão sendo diagnosticados com disforia de gênero e, com isso, levados a tratamentos. Muitos, fundamentado em estudos, no porvir, poderiam não ser trans, mas simplesmente gays e lésbicas”.
“Estudos mostram que, alguns anos detrás, a tendência, quando se tinha casos diagnosticados [de disforia de gênero], era tentar fazer com que a rapaz não mantivesse [o quadro]. Hoje, a tendência é fazer um viés de confirmação. Se a rapaz de 4 anos diz que é trans, muitos serviços acabam mantendo ou estimulando”, ressalta.