Veto à terapia hormonal para jovens trans preocupa médicos; entenda

Em solução publicada na quarta-feira (16) no Quotidiano Solene da União, o Parecer Federalista de Medicina (CFM) vetou terapias hormonais para menores de 18 anos e alterou a idade mínima para cirurgias de transição de gênero para 21 anos.

A solução n.º 2.427/2025 revisa critérios técnicos para o atendimento a pessoas com disforia de gênero, quesito caracterizada pelo desconforto ou sofrimento entre a identidade de gênero e o sexo atribuído ao promanação.

A publicação trata de três pontos principais: a proibição da terapia hormonal cruzada a menores de 18 anos; o veto para cirurgias de redesignação de gênero com potencial efeito esterilizador para menores de 21 anos, e a proibição da receita de bloqueadores hormonais para tratamento de disforia de gênero em crianças e adolescentes.

A terapia hormonal cruzada é um tratamento caracterizado pela governo de hormônios sexuais para induzir características secundárias condizentes com a identidade de gênero do paciente. Já os bloqueadores hormonais de puberdade são medicamentos que postergam ou interrompem mudanças físicas características da puberdade, sendo usados para o consolação da disforia de gênero.

A solução foi criticada por associações ligadas à comunidade LGBTQIAP+, uma vez que a Associação Pátrio de Travestis e Transexuais (ANTRA) e a Associação Mães Pela Inconstância, que consideram as atualizações um “retrocesso” em relação aos direitos de entrada à saúde conquistados pela população transgênero.

As decisões também preocupam especialistas. Tayane Muniz Fighera, coordenadora do Departamento de Endocrinologia Feminina, Andrologia e Transgeneridade da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM), fala à CNN sobre o risco de a proibição aumentar a procura por tratamentos hormonais alternativos sem evidência científica adequada e sem séquito médico.

“O que nós vemos na prática é que muitas dessas pessoas chegam até nós com uma história de longa data de insulto de hormônios porque não conseguiram encontrar o guarida de um profissional que, de indumento, conseguisse prestar um atendimento adequado. Eles não deixam de fazer o tratamento, porque a disforia traz muito sofrimento para essas pessoas, mas eles acabam fazendo de forma errada”, afirma Fighera.

Outra preocupação é em relação à saúde mental da população transgênero. Do ponto de vista de Emmanuel Nasser, ginecologista e obstetra especializado no atendimento à população LGBTQIAP+, a solução pode ter um impacto significativo na saúde mental dos pacientes.

“Nós estamos falando sobre isolamento social, aumento da evasão escolar, aumento do índice de depressão refratária, aumento de ideação suicida ou, até mesmo, a consumação do ato de autoextermínio, além da automutilação. Portanto, estamos falando sobre um impacto contraditório na saúde mental dessas pessoas, seja privando-as de acessarem as tecnologias hormonais a partir dos 16 anos, seja impedindo que essas crianças acessem o bloqueio hormonal”, afirma Nasser à CNN.

Quais eram as diretrizes anteriores e o que mudou?

A novidade solução revoga as diretrizes anteriores da solução n.º 2.265/2019, publicada em janeiro de 2020 no Quotidiano Solene da União. Anteriormente, a terapia hormonal cruzada era permitida a partir dos 16 anos, desde que iniciada posteriormente o início da puberdade e em caráter experimental em protocolos de pesquisa.

Com a novidade solução, a terapia está vedada antes dos 18 anos e deverá ser feita posteriormente séquito psiquiátrico e endocrinológico por, no mínimo, um ano, e posteriormente avaliação cardiovascular e metabólica com parecer médico favorável.

Outrossim, a norma anterior permitia a realização de procedimentos cirúrgicos de asseveração de gênero a partir dos 18 anos. Agora, a cirurgia é vedada antes dos 21 anos quando implicarem potencial efeito esterilizador, e só poderá ser realizada posteriormente séquito prévio de, no mínimo, um ano por equipe médica.

Por término, a solução de 2019 permitia a terapia de bloqueio hormonal em adolescentes a partir da puberdade em protocolos de pesquisa, em hospitais universitários e/ou de referência para o Sistema Único de Saúde (SUS). Agora, a prática está proibida para todas as crianças e adolescentes, exceto em situações de puberdade precoce ou outras doenças endócrinas nas quais o uso de bloqueadores hormonais é cientificamente indicado.

“O que nós fazíamos, anteriormente, enquanto intervenções, era postergar a puberdade, porque entendemos que o sofrimento psíquico, chamado disforia, aparece justamente quando os caracteres secundários, uma vez que contornos corporais, seios, mênstruo ou pelos faciais, surgem. Isso acaba agindo uma vez que um gatilho para esses sofrimentos”, explica Nasser. “Até a solução antiga, isso era feito em um protótipo de pesquisa. Em São Paulo, por exemplo, que é o estado mais rico e populoso do país, unicamente um meio fazia o bloqueio puberal. E isso era feito seguindo critérios rigorosos”, completa.

Fighera acrescenta, ainda, que, uma vez iniciado o tratamento, o paciente tinha dados de saúde monitorados, uma vez que dados de densidade mineral óssea, velocidade de desenvolvimento e exames de sangue, sendo feitos ajustes na terapia hormonal quando necessário. “Existia uma série de critérios que eram seguidos rigorosamente para fazer esse tratamento [em adolescentes]”, afirma.

Apesar das mudanças, as disposições na novidade solução do CFM não se aplicam a pessoas que já iniciaram a terapia hormonal ou o bloqueio de puberdade.

O que o CFM diz?

Em coletiva de prensa realizada na quarta-feira (16), um dos relatores da solução, Raphael Câmara, argumentou que seria “muito difícil” a medida levar à ampliação do uso de hormônios por conta própria, sem séquito.

“A forma de obter essas substâncias, que não tem em farmácias, a dificuldade é muito maior. Não acreditamos que isso vai ocorrer. Obviamente, casos pontuais podem ocorrer, mas isso não vai ocorrer de grande monta”, afirma.

Durante sua apresentação, Câmara afirmou que a solução tomou uma vez que base evidências científicas que mostrariam aumento no número de arrependimentos em relação ao processo de transição de gênero, e casos de tentativa de reversão do processo de transição.

Por outro lado, o relator afirmou que a norma também levou em consideração pesquisas que mostram o contrário, que o índice de compunção é grave. Segundo Câmara, há um “sobrediagnóstico” de pessoas trans, o que levaria a um índice de compunção grande em relação ao processo.

“Mais crianças e adolescentes estão sendo diagnosticados com disforia de gênero e levados a tratamento. Muitas crianças que no horizonte poderiam não ser trans, mas simplesmente gays e lésbicas”, afirmou.

O médico admitiu, no entanto, que não há uma resposta sobre o tema, porque os estudos existentes não têm evidências robustas. “Às vezes, a falta de evidência exige prudência”, afirmou. De harmonia com ele, foram analisados estudos que mostram desde um índice de 2% de compunção a pesquisas que indicam até 40%.

Médicos que descumprirem solução serão punidos, afirma CFM

Também na coletiva, o presidente do CFM, Hiran Gallo, afirmou que os médicos que descumprirem a solução do órgão serão punidos com medidas uma vez que mensagem, increpação, suspensão ou, até mesmo, cassação do registro.

“É uma norma do Parecer Federalista de Medicina que tem que ser cumprida”, disse Gallo.

MPF apura validade da norma

O Ministério Público Federalista (MPF) instaurou na segunda-feira (14) um procedimento para apurar a validade da solução do CFM.

O procedimento foi crédulo pelo MPF a partir de uma denúncia da entidade e de uma nota técnica da Associação Pátrio de Travestis e Transexuais (Antra). As associações destacam que jovens trans têm o entrada a procedimentos terapêuticos uma vez que bloqueio puberal e hormonização cruzada amparados pela Solução n.º 2.265/2019, que permanece válida.

O procurador regional dos Direitos do Cidadão no Acre, Lucas Costa Almeida Dias, deu um prazo de 15 dias para que o CFM preste informações sobre os fundamentos técnicos e jurídicos que embasaram a decisão. Ele cita decisões do Supremo Tribunal Federalista que vão na direção oposta e lembra que a Organização Mundial da Saúde (OMS) deixou de considerar a transexualidade uma doença.

*Com informações de Paula Ferreira e Gabriel Damasceno, do Estadão Teor

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